Longevidade: um problema ou uma oportunidade?

Longevidade: um problema ou uma oportunidade?

A longevidade representa uma conquista civilizacional de que nos devemos orgulhar e aproveitar — nunca uma justificação para problemas de ordem económica, social ou de saúde. É verdade que existe um conjunto de doenças crónicas habitualmente associadas à idade e que constituem um fator de pressão sobre os sistemas de saúde em geral e do Serviço Nacional de Saúde (SNS) em particular. Todavia, nem a idade per si é responsável pelo aumento da carga de doença, nem os problemas do SNS são fruto do envelhecimento da população. Na verdade, existem várias comunidades em que as pessoas com mais de oitenta anos são maioritariamente saudáveis e em que os sistemas de saúde respondem a tempo e horas às necessidade e expectativas dos cidadãos, independentemente da sua idade.

O aumento da carga de doença é uma consequência de comportamentos de risco desenvolvidos desde a infância, mas que normalmente só se refletem na idade adulta e, sobretudo, a partir dos 55 anos de idade. A esperança média de vida à nascença em Portugal (1) era de 82 anos em 2022; ou seja, mais 18 anos que em 1960. Porém, o número de anos de vida com saúde (indicador também designado por esperança de vida sem incapacidades)(2) era em 2020 de 60 anos, o que significa 22 anos de vida com algum tipo de doença ou incapacidade.

Mas, será uma inevitabilidade vivermos os últimos anos de vida com algum tipo de incapacidade física ou mental? Creio que não. Aliás, a realidade dos países nórdicos e de algumas comunidades espalhadas pelo mundo demonstram-no bem. Descartada a inevitabilidade da longevidade devemos interrogarmo-nos sobre quais os verdadeiros riscos para a saúde e procurar evitá-los ou mitigá-los.

Em 2009, a Organização Mundial de Saúde (OMS) publicou o Top 10 das principais ameaças à saúde global:

  1. Alterações climáticas e poluição do ar;
  2. Doenças não transmissíveis, como a diabetes, o cancro e doenças cardiovasculares;
  3. Pandemia global por influenza (que se confirmou com a COVID 19 em 2019);
  4. Cenários de vulnerabilidade e fragilidade (seca, fome, conflitos armados, migrações);
  5. Resistência antimicrobiana;
  6. Ébola e outras doenças altamente patogénicas;
  7. Deficiente cobertura de cuidados primários;
  8. Resistência à vacinação;
  9. Dengue, que já ameaça 40% da população mundial e já não se restringe aos trópicos;
  10. HIV/SIDA.

Relativamente às principais causas de morte, o cenário nos países da OCDE em 2019 era o seguinte:

  1. Doenças cardiovasculares 28%;
  2. Cancro 21%;
  3. Doenças do sistema respiratório 9%;
  4. Covid 19 7%;
  5. Causas externas 6% (acidentes 4% e suicídios 1%);
  6. Alzheimer e outras demências 6%;
  7. Diabetes 3%;
  8. Outras causas 21%.

Cruzando as ameaças à saúde global elencadas pela OMS, com as principais causas de morte nos países da OCDE, verificamos que muitos dos riscos podem ser evitados e mitigados através de políticas públicas (globais, nacionais e locais) que incentivem a adoção de estilos de vida mais saudáveis. Relativamente às políticas públicas é importante reter a seguinte ideia: existem determinantes de saúde exógenos e endógenos. No primeiro grupo incluímos o rendimento das famílias, o meio ambiente, o habitat, as condições gerais de trabalho e o nível de escolaridade e literacia da população. No segundo grupo incluímos o fator genético e os comportamentos individuais e coletivos que prevalecem na sociedade.

Em Portugal, independentemente do governo em funções, o discurso político gira sempre em redor da prestação de cuidados de saúde e quase nunca sobre a promoção e a prevenção. Por isso, gasta-se cada vez mais dinheiro na prestação de cuidados e investe-se pouco na promoção e prevenção. Compreendo, mas não aceito! O país precisa de políticas transversais que contribuam para a melhoria das condições de vida dos portugueses e os ajudem a adotar estilos de vida mais saudáveis. Já diz o ditado popular: “Mais vale prevenir, que remediar”; mesmo em saúde.

Pedro Serra Pinto
Membro Executivo do Fórum Saúde XXI

Artigo publicado no jornal Observador em 20 de janeiro de 2025

(1) Fonte: eurostat khttps://data.worldbank.org/indicator/SP.DYN.LE00.IN?locations=PT
(2) Fonte: eurostat https://ec.europa.eu/eurostat/web/metadata/classifications

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