Inovação disruptiva em saúde

Inovação disruptiva em saúde

O conceito de inovação disruptiva surgiu inicialmente nos Estados Unidos, e rapidamente se generalizou a utilização deste termo nas discussões ligadas à saúde. Mas como é frequente em novas ideias, o uso e abuso surgem juntos. É por isso útil tornar mais concreto o seu significado. O Expert Panel on Effective Ways of Investing in Health, que trabalha com a Comissão Europeia, publicou recentemente uma análise do conceito e das suas implicações. Nem toda a inovação que existe e existirá é disruptiva, nem apenas a inovação disruptiva tem e terá valor para a sociedade.
Uma das formas de classificar as inovações é pelo seu impacto nos mercados que existem no momento do seu aparecimento. Uma inovação que melhora um serviço ou produto de saúde num mercado de uma maneira que é esperada e antecipada pelos utilizadores é uma inovação de sustentação e de continuidade. Pode gerar elevados ganhos em saúde, mas não faz a disrupção do modelo de organização dessa actividade. Hoje em dia fala-se muito em dispositivos de leitura de parâmetros individuais e sua comunicação remota. Na medida em que esses dispositivos são antecipados e inseridos em modelos de funcionamento existentes, não serão inovação disruptiva (mesmo que tecnologicamente sejam novidades surpreendentes).

Se a inovação é inesperada e não antecipada, mas não altera de forma radical o funcionamento do mercado, então será uma inovação de sustentação e de descontinuidade. Não será ainda uma inovação disruptiva, pois mantém essencialmente inalterado o papel dos principais intervenientes.

Assim, uma inovação disruptiva será uma inovação que cria um novo mercado, ou gera uma expansão do mercado existente, através da utilização de um diferente conjunto de valores, que acaba por, de forma inesperada, substituir o mercado anterior. Por mercado entende-se aqui a organização de uma actividade de prestação de cuidados de saúde, seja o prestador de natureza pública ou privada.

De acordo com o proposto pelo Expert Panel, uma inovação disruptiva pode ser caracterizada pela presença de alguns dos (ou todos os) seguintes elementos: melhoria dos resultados de saúde, criação de novos serviços ou ultrapassar barreiras de acesso a serviços existentes ou a novos serviços, ter custo-efectividade que origine maior acesso a esses produtos ou serviços, promoção de cuidados de saúde centrados no cidadão, alterar radicalmente os anteriores modelos de organização, criação de novas capacidades e novos papéis profissionais, criar novos conjuntos de valores para os profissionais da área, para os doentes, para os cidadãos e para a comunidade, e introduzir alterações de cultura na prestação de cuidados de saúde.

Desta caracterização resulta que um elevado conteúdo tecnológico não é condição necessária nem é condição suficiente para se ter uma inovação disruptiva. Uma inovação disruptiva pode ter pouco conteúdo tecnológico e ainda assim transformar de forma radical a forma como determinado tipo de cuidados de saúde são prestados. Uma inovação de elevado conteúdo tecnológico se mantiver a mesma cultura e organização não será uma inovação disjuntiva.

Devido às suas características, uma inovação disruptiva é dificilmente previsível. Tende a ser identificável apenas depois de ter ocorrido. Assim, não se deve pensar em políticas que apoiem este ou aquele produto ou serviço por ter um elevado conteúdo tecnológico e logo disruptivo. É necessário pensar em mecanismos que facilitem a adopção e a transformação associada com a inovação disruptiva, trabalhando sobre as barreiras que possam existir. A utilização de experiências piloto é uma dessas formas, acompanhando os resultados nas dimensões de relevância para os resultados em saúde, eficiência, equidade, qualidade, papel do cidadão e sustentabilidade financeira. Diferentes barreiras vão requerer mecanismos também eles diferentes. Ultrapassar barreiras culturais dos profissionais de saúde e dos cidadãos precisa de mecanismos diferentes de barreiras e natureza institucional ou legal, por exemplo.

Será aqui mais importante encontrar os contextos que não destruam à partida as inovações disruptivas, mais do que identificar à partida quais serão. E ter a noção de que a inovação disruptiva será menos comum do que se pensa, e sobretudo que muita inovação reclamada como disruptiva não o será realmente. O filtro primeiro é simples, olhar para o que sucede ao modelo de organização da prestação de cuidados e ao impacto sobre a cultura dos intervenientes nesse processo.

Pedro Pita Barros
Nova School of Business and Economics, Universidade Nova de Lisboa

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